Confesso que me delicio sempre a ver a pressa das pessoas em sair dos aviões logo que estes aterram, embora compreenda essa vertigem de pisar terra firme, depois de algumas horas fechadas a desafiar a lei da gravidade. Mal a aeronave se imobiliza na pista e é vê-las ansiosas em busca dos pertences que normalmente atafulham os compartimentos situados por cima dos assentos, apenas para depois esperarem carregadas, de pé, no corredor. É certinho e não falha, e pude confirmar isso mesmo, uma vez mais, na chegada a Veneza.
Abençoados pela forte chuva oblíqua que caía do céu carregado, decidimos abandonar o pássaro pela escada dianteira ao invés da traseira, pois íamos sair directamente para a pista, sem qualquer protecção (cobertura, guarda-chuva ou impermeável), e aquela era a única que dispunha de coberta. Mas como estávamos na cauda do bicho, tivemos de esperar que saíssem todos os incautos prestes a ficarem encharcados de modo a podermos retomar o caminho corredor adentro. Connosco ficou também uma velhota americana, de andar vagaroso, cujo conhecimento sobre Lisboa se limitava, conforme testemunhei depois numa breve conversa, ao voo de escala efectuado pelo seu avião, vindo dos Estados Unidos, em direcção a Itália.
Chegados finalmente à porta da frente, uma falha de comunicação hilariante entre a italiana que gesticulava energicamente no comando das operações de desembarque, na pista do aeroporto, e uma das hospedeiras da TAP, fez com que a primeira desse ordem de marcha antes de tempo ao autocarro que esperava os últimos cinco passageiros - eu, a Mónica, a americana e uma senhora aparentando cerca de 40 anos, deficiente de cadeira de rodas, que aguardava pacientemente juntamente com o marido a chegada do ambulatório.
Perante o caricato mal-entendido, a aeromoça logo vociferou:
- Estes italianos são mesmo estúpidos!
Depois de saber que se travava da primeira vez que estávamos, segundo ela, na confusão das terras transalpinas, virou-se para nós, incrédulos a assistir àquele pitoresco quadro surrealista, e disparou com um sorriso irónico:
- Bem-vindos a Itália!
Pouco depois, entre sonoras gargalhadas provocadas pela inusitada recepção de que fomos alvo, lá pusemos o pé firme em solo italiano levados todos pelo veículo ambulatório.
NAVEGADOR DA PASSAGEM - OS CAURIS
Há 3 meses
3 comentários:
Ora então cá estamos!
Gostei muito do teu primeiro post, podes contar com uma leitora assídua e participativa!
Fizeste-me lembrar os tempos em que trabalhei na TAP, os embarques e desembarques, as pessoas, os destinos, os imprevistos (mais que muitos), o stress, a responsabilidade, a camaradagem, pequenos gestos que mudam a atitude e o dia dos passageiros... foi uma experiência única:-)
Seja bem-vinda a minha principal instigadora nestas andanças! E venham de lá essas histórias :-)
Ora tenho a dizer que não me importava nada de andar agora nessas confusões de aviões e aeroportos... significava que estava em viagem, que é coisa que não faço há um ano e que gosto tantooooooo!
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