31 de julho de 2008

Fina literatura

Quem, como eu, se iniciou nas aventuras musicais da adolescência como autodidacta da viola, decerto tropeçou em alguma ocasião nos livros de solfejo do fascinante Eurico A. Cebolo.

Num tempo em que a Internet era ainda uma miragem e frequentar uma escola de música um luxo, os populares e didácticos manuais deste transmontano nascido em 1938 garantiam a qualquer jovem o primeiro contacto com a clave de Sol, as mínimas, breves e semibreves.

Vem isto a propósito de uma reportagem que vi há dias no sociológico, instrutivo e hilariante programa Liga dos Últimos, da RTP N, que versa sobre o futebol distrital e o Portugal profundo, espalhado pelo Mundo. A dada altura, um casal de emigrantes na Holanda que se dedica a propagandear o desporto-rei lusitano, folheava os livros da sua biblioteca quando alguns deles me despertaram a atenção.

O autor era precisamente o dito senhor Cebolo que, pelos vistos, entretanto enveredara também pela carreira de escritor. Além dos títulos e das curtas sinopses, deixo as sugestivas e coloridas capas dos livros, todos eles edições de autor, tais como, aliás, os manuais de música.

E pensar que comecei a aprender o que era a pauta pela cartilha do Cebolo!

O padre Januário é acusado de ter uma filha, Isabel, e de roubar as jóias dos Mendonça que valiam uma fortuna.

Natália foi difamada publicamente e o seu pai, acusado pela morte do sogro, morre assassinado à sacholada.

Duas crianças, trocadas ao nascer, vivem no mesmo palacete onde a rica ocupou a posição da pobre, de quem passa a ser criada, enquanto a pobre tomou o lugar da rica que odeia e maltrata.

Miriam, uma cristã a quem os romanos cegaram e escravizaram, é condenada a morrer queimada, mas uma poderosa força a protege.

Carmencita, a cigana sedutora, lia a sina nas palmas da mão que lhe estendiam, mas não via nelas o segredo do seu nascimento.

A irmã Teresa, a freira mais linda do Convento das Cristianas, descobriu que ali havia um terrível mistério.

Miguel e Damião amavam-se como irmãos e cresceram juntos numa quinta onde um criado os levou a práticas sexuais aberrantes.

O amor de um cego por uma jovem desfigurada. Um cemitério onde um necrófilo profanava os túmulos para violar as mortas.

Maria Alice é dada como morta no desatre ferroviário de Alcafache. O homem que antes a desonrou casa com a própria irmã.

30 de julho de 2008

O susto

E se, de repente, em pleno Verão, um intrigante barulho interrompesse a tranquilidade da leitura do excelente As Mulheres do Meu Pai, de José Eduardo Agualusa, na apetecível esplanada do café da Praia Fluvial da Peneda, sobranceira ao rio Ceira, na pacata vila de Góis?

Pois é, não fora a mudança de local, por causa do sol abrasador, e não sei o que poderia ter acontecido quando, lá do alto, se desprenderam vários ramos de uma das árvores, arrastando outros na queda e desabando todos, com estrondo, sobre mesas, cadeiras e estrado de madeira.

Refeito do susto, pude depois completar 15 dias de autêntico retiro na serra com a degustação - a conselho de muito boa gente - do imperdível A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Záfon e Aos Olhos de Deus, de José Manuel Saraiva, romance histórico que relata a espampanante embaixada portuguesa enviada por D. Manuel I ao Papa Leão X (Giovanni di Medici), livro de leitura fácil, simples e honesto.

Depois de um período intenso de trabalho, estava mesmo a precisar de paz e descanso, físico e mental.

Nota: A fotografia, tirada da Ponte Real, mandada construir em 1533 por D. João III, é do site do Góis Moto Clube, responsável pela realização num dos fins-de-semana de Agosto da famosa concentração de amantes das duas rodas.